domingo, 14 de outubro de 2018

Resenha || O Mito da Beleza, de Naomi Wolf

Rosa dos Tempos, 2018 || 490 páginas || Skoob
Sinopse: Um dos livros mais importantes da terceira onda feminista. Clássico que redefiniu nossa visão a respeito da relação entre beleza e identidade feminina. Em o mito da beleza , a jornalista Naomi Wolf afirma que o culto à beleza e à juventude da mulher é estimulado pelo patriarcado e atua como mecanismo de controle social para evitar que sejam cumpridos os ideais feministas de emancipação intelectual, sexual e econômica conquistados a partir dos anos 1970. As leitoras e os leitores encontrarão exposta a tirania do mito da beleza ao longo dos tempos, sua função opressora e as manifestações atuais no lar e no trabalho, na literatura e na mídia, nas relações entre homens e mulheres e entre mulheres e mulheres. Naomi Wolf confronta a indústria da beleza, tocando em assuntos difíceis, como distúrbios alimentares e mentais, desenvolvimento da indústria da cirurgia plástica e da pornografia. Esta edição, revista e ampliada, traz uma apresentação da autora contextualizando o livro para os leitores de hoje, já que esteve mais de duas décadas longe das livrarias brasileiras.  

RESENHA ✍

O Mito da Beleza é um clássico da terceira onda feminista escrito por Naomi Wolf na década de 1990 que renova a preocupação e a consciência sobre como a mídia de propaganda atinge as mulheres em variados contextos, seja na aparência, trabalho, direitos, maternidade, relações conjugais ou sociais.

O livro é dividido em oito partes: o mito da beleza, o trabalho, a cultura, a religião, o sexo, a fome, a violência e "para além do mito da beleza"; contando também com apresentação (da autora), introdução, agradecimentos, notas, bibliografia e índice remissivo. É uma obra completa, onde Naomi se mune de fatos, estatísticas e pesquisas, citando outras autoras, trabalhos e livros feministas no caminho. Como um livro de não ficção, O Mito da Beleza se consagra como uma das leituras mais importantes para entender a construção da imagem da beleza e perfeição física e de comportamento que são impostos às mulheres, como a autora tão bem explica:
"O mito da beleza tem a seguinte história a contar. A qualidade chamada 'beleza' existe de forma objetiva e universal. As mulheres devem querer encarná-la, e os homens devem querer possuir mulheres que a encarnem. Encarnar beleza é uma obrigação para as mulheres, não para os homens, situando esta necessária e natural por ser biológica, sexual e evolutiva. (...) Nada disso é verdade. A 'beleza' é um sistema monetário semelhante ao padrão-ouro. Como qualquer sistema, ele é determinado pela política e, na era moderna no mundo ocidental, consiste no último e melhor conjunto de crenças a manter intacto o domínio masculino. Ao atribuir valor às mulheres numa hierarquia vertical, de a cordo com um padrão físico imposto culturalmente, ele expressa relações de poder segundo as quais as mulheres precisam competir de forma antinatural por recursos dos quais os homens se apropriaram." (p. 29)
O processo que envolve a mídia e seu culto à beleza e juventude da mulher é explicado maravilhosamente por Wolf, que nos entrega um livro muito relevante e necessário, com dados reais, texto muito bem escrito e oportunidades de reflexão acerca do tema. A 'beleza' como é vista e desejada hoje é resultado do patriarcado, de uma sociedade machista que perpetua a ideia da "perfeição", que para ser atingida mata milhares de mulheres no processo, no mundo todo. Sim, mata. Naomi traz estatísticas sobre as mortes por trás de revistas e programas de dietas absurdas, procedimentos estéticos perigosos e pílulas que são verdadeiros venenos, deteriorando a saúde e até matando pessoas que tentam atingir aquela ideia de beleza a acabam caindo na ideia de inadequação que, também, pode levar a morte. A indústria da beleza é perigosa, e é assim há muito tempo.

E é também dessa busca incansável pela 'beleza' que a industria midiática se alimenta, se sustenta. O ideal feminino, de postura perfeita, corpo escultural, comportamento submisso, rosto simétrico, liso, impecável... tudo isso transforma as mulheres e crianças, em reféns, escravos de uma ideia machista, que sexualiza e tortura enquanto lucra milhões, bilhões de reais.
"Nos anos 50, as rendas com publicidade aumentaram extraordinariamente, alterando o equilíbrio entre o departamento editorial e o de publicidade. As revistas femininas passaram a interessar às 'companhias que, com a guerra a ponto de terminar, teriam de fazer com que as vendas ao consumidor tomassem o lugar dos contratos de materiais bélicos'. (...) Os relatórios dos especialistas em marketing descreviam formas de manipular as donas de casa para que se tornassem consumidoras inseguras de produtos para o lar." (p. 101)
O segundo capítulo do livro é dedicado ao tema trabalho, e nele a autora vai trazer também fatos sobre como esse mito da beleza atinge as mulheres na busca por empregos, especialmente os de destaque, pois entra na equação os empregadores que procuram funcionárias que atingem certos padrões, padrões esses altíssimos, e a idade dessas mulheres. Homens grisalhos não enfrentariam tanta dificuldade para conseguir um cargo na televisão, diferente das mulheres que mostram os mesmos sinais de idade. A autora traz diversos exemplos, e é doloroso ver tanta verdade, tantos fatos reunidos.

É muito interessante, e tanto assustador, ler sobre isso. É revoltante imaginar que vivemos em mundo que nos machuca, nos desestabiliza, e que isso não é de hoje, como também está longe de acabar. O Mito da Beleza é um livro que abre os olhos, a mente, nos mostra a realidade da indústria como ela é, patriarcal e perigosa, exigente e manipuladora, incentivando a rivalidade e também a submissão. Das (e entre as) mulheres, claro.
"(...) apesar da vergonha, da culpa e da negação, é cada vez maior o número de mulheres que se pergunta se elas são mesmo totalmente neuróticas e solitárias ou se o que está em jogo tem a ver com a relação entre a libertação da mulher e a beleza feminina. Quanto mais numerosos foram os obstáculos legais e materiais vencidos pelas mulheres, mais rígidas, pesadas e cruéis foram as imagens da beleza feminina a nós impostas." (p. 25)
Leitura recomendadíssima, e não só para mulheres. Acredito que essa é uma leitura que todos deveriam fazer; todos que querem dar uma olhada no que existe atrás da grossa parede construída pela industria da beleza; para quem quer sair da caixinha, espiar, ler algumas verdades.

Ao mesmo tempo que a leitura é super válida e repleta de bons argumentos, a escrita da autora pode ser um pouco intrincada, e alguns capítulos bem densos, requirindo mais atenção e tempo do leitor; não é uma leitura rápida. É um livro que continuarei lendo, relendo e fazendo minhas anotações.

Leiam! :)

Um comentário :

  1. Fascinante a leitura deste livro, não posso cocluir um pensamento sobre ele, pois vou para o capítulo que fala do sexo. Mas achei intrigante a forma como ela faz tudo isso: os dados são de arrepiar.
    Sua resenha é ótima, obrigado!

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