quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Resenha || Ariel, de Sylvia Plath

Verus, 2018 || 208 páginas || Skoob
Sinopse: Com a publicação póstuma do livro de poesia Ariel, em 1965, Sylvia Plath se tornou um nome de destaque na literatura norte-americana. No entanto, o manuscrito de Ariel deixado pela autora quando morreu, em 1963, era diferente do volume de poemas então publicado e mundialmente aclamado. Esta edição bilíngue e fac-similar restabelece pela primeira vez a seleção e o arranjo dos poemas exatamente como Sylvia Plath os deixou antes de se suicidar. Além da reprodução dos manuscritos da autora, este volume também inclui os rascunhos completos do poema-título, “Ariel”, oferecendo ao leitor a oportunidade de acompanhar o processo criativo da poeta. Com esta publicação, o legado de Sylvia Plath pode ser reavaliado à luz de seu trabalho original e permanece conforme sua vontade. Sylvia Plath conseguiu, em Ariel, transformar em poesia tanto assuntos particulares como eventos históricos trágicos. Seus poemas evidenciam as dores de uma vida traumática, marcada pela morte do pai e pelos conflitos com o marido infiel, e são a prova do talento dessa poeta que, com otimismo ou sofrimento, soube unir técnica e emoção e criar uma obra já clássica.  

RESENHA ✍

Vamos iniciar esse texto com uma frase famosa do escritor Ernest Hemingway (1899-1961) sobre a escrita: There is nothing to writing. All you do is sit down at a typewriter and bleed.” Tudo o que lhe resta fazer, quando você senta frente a uma máquina de escrever, é sangrar. E Sylvia Plath sangra em sua escrita; sangra porque não há nada em seus textos  que não carregue nem que seja um pouco de tristeza, desalento, enfermidade e tragédia, tudo o que a levou a última decisão que tomaria, e pela qual se tornaria conhecida, mais ainda que pelos seus melancólicos escritos: seu suicídio aos 30 anos de idade.

A relação conturbada com o marido infiel, o aborto que sofreu (e que é um tema recorrente em vários de seus poemas), a depressão, os conflitos na família, a morte do pai... Como não sangrar no papel todo tormento pelo qual passou? Sylvia escreveria também, em um de seus diários “let me live, love, and say it well in good sentences”. Não há dúvidas, conhecendo um pouco de sua biografia, de que ela viveu intensamente; não deveria ser uma surpresa, então, encontrar em sua poesia essa intensidade, essa vivacidade e essa inquietude presente em todos os poemas que compõem "Ariel".

Desejei esse livro por muito tempo! O título ficou um bom tempo esgotado e só agora, com uma nova edição da Verus Editora, finalmente tive a oportunidade de realizar a leitura, e da melhor forma possível quando o assunto é uma coleção de poemas: em edição bilíngue, com o texto original de um lado e a tradução (de Rodrigo Garcia Lopes e Cristina Macedo) no outro. Sempre que encontro um poema cujo texto original é em outra língua, faço uma pesquisa e questão de ler as duas versões, mesmo que não entenda aquele idioma. A forma, a cadência... Muito é perdido na tradução de poemas, como bem sabemos. Acabamos lendo a interpretação dos tradutores sobre aquele texto. E isso torna a leitura menos válida? A resposta é não, não torna a leitura menos válida, de forma alguma. É preciso entender que a tradução e a revisão de um livro, independente do gênero, enfrenta certas dificuldades, e que o poema, por possuir a forma de versos e harmonia que manifestam sentimentos e tendem a emocionar o leitor, muitas vezes não só pelas palavras, mas a forma como foram derramadas naqueles versos, o som da união entre uma e outra... é uma dificuldade ainda maior. Eu, pessoalmente, prefiro quando a tradução se mantém o mais fiel possível ao texto original, quando é possível mantendo o ritmo etc, e os tradutores de Ariel fizeram um trabalho realmente muito bom.

Não há nada como a leitura de um bom poema em certos momentos da vida.


Mulher estéril

Vazia, ecoo até o mínimo passo,
Museu sem estátuas, grandioso, com pilares, pórticos, rotundas.
Em meu pátio uma fonte salta e mergulha em si mesma,
Casta e cega para o mundo. Lírios de mármore
Exalam sua palidez feito perfume.

Me imagino com um grande público,
Mãe de uma branca Nike e vários Apolos de olhos nus.
Em vez disso, os mortos me ferem com atenções, nada pode acontecer.
A lua pousa a mão em minha testa,
Pálida e silenciosa como uma enfermeira.

Barren woman

Empty, I echo to the least footfall,
Museum without statues, grand with pillars, porticoes, rotundas.
In my courtyard a fountain leaps and sinks back into itself,
Nun-hearted and blind to the world. Marble lilies
Exhale their pallor like scent.

I imagine myself with a great public,
Mother of a white Nike and several bald-eyed Apollos.
Instead, the dead injure me with attentions, and nothing can happen.
The moon lays a hand on my forehead,
Blank-faced and mum as a nurse.


"Ariel" teve um começo difícil, sendo publicado por Ted Hughes com algumas alterações do manuscrito original deixado por Plath em cima de sua escrivaninha no dia de sua morte, na ordem que ela queria que fosse publicada. Muitos poemas ficaram de fora dessa primeira publicação; poemas que falam da infidelidade de Ted, sobre alguns amigos e sua família e que Hughes, para "se preservar", colocou-os de lado até que, depois de sua morte, os direitos sobre as obras de Plath passaram para sua filha, Frieda Hughes, que estava mais do que disposta a reunir novamente os textos de sua mãe da forma como a mesma tinha desejado antes, respeitando a ordem dos poemas e a vontade de Sylvia.


Um dos poemas excluídos por Ted da coleção foi Mulher estéril (Barren Woman), entre muitos outros. Com a apresentação intitulada O Caso Ariel, escrita pelo Rodrigo Garcia Lopes e o prefácio de Frieda Hughes, é possível compreender mais a fundo a importância dessa publicação e, mais além, a recuperação de um documento que teve tantas alterações ao longo do tempo e que por muitos anos foi contra o que a própria escritora queria. Mesmo após sua morte, Sylvia foi calada; teve seus gritos de vingança e dor abafados em uma gaveta fechada por muito tempo. Essa leitura, tanto dos textos de apoio quanto dos poemas em si, são essenciais para um entendimento maior dessa personalidade arrasadora que foi a Sylvia Plath.

Esse é um livro muito bonito, com fac-símile dos escritos originais e, no final, a presença de diversos rascunhos do poema-título, Ariel, em diversas fases de sua "preparação" para o que conhecemos hoje.

Leitura recomendadíssima! 

13 comentários :

  1. Oi, Gabrielly! :D
    Adorei o texto! Há alguns anos eu ouço falar o nome de Sylvia Plath, mas nunca havia sido apresentada à sua história e por isso não sabia nada sobre a autora até ler o seu texto. Gosto muito de poemas, inclusive estou lendo um livro de um poeta francês atualmente, e da mesma forma que você me sinto um pouco triste ao refletir sobre esta questão de que a tradução não é capaz de transmitir toda a mensagem que foi colocada no poema original. Gostei muito de conhecer sobre esta autora e pretendo pesquisar mais sobre ela e sua triste história. Seu texto é muito agradável e bem escrito. Parabéns pela resenha. Beijos!

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  2. Olá, Gabi.

    A temática do livro é bem pesada, a autora parece carregar muita dor ao relatar sua vida nesses poemas. Fiquei triste ao saber que ela morreu, mas pelo menos seu livro foi publicado e o mundo tem a chance de conhecer essa guerreira!

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  3. Oi Gabi, que resenha maravilhosa, tô completamente encantada, voce soube melhor do que ninguém, resenhar uma obra tão maravilhosa como Ariel, esse é um livro que eu vinha torcendo para ser relançado tem um tempinho, porque tudo que acontece envolta dele é bastante confuso, a começar pelas manobras do Tedd para tirar de circulação alguns poemas que remetiam a ele. A edição tá linda demais! Fora a carta escrita pela filha, me tocou bastante.

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  4. Oi Gabi, essa é a primeira vez que eu tenho contato com a autora e sua escrita. Imagino que deve ser um livro bem profundo e íntimo. É muito revoltante saber que por muitos anos vários poemas dela terem ser escondidos e só a pouco tempo depois da morte do marido terem sido lançados.

    Gostei muito do seu post, as fotos ficaram sensacionais e bem escrito.

    Beijos

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  5. Oi! Essa leitura está na minha lista de leituras imediatas. Eu conheci a autora há pouco tempo relativamente, e assim que tomei conhecimento sobre sua obra e vida, fiquei apaixonada. Esse livro, que reúne os poemas que não foram publicados inteiramente pelo marido que interferiu, é um tesouro. Você fez uma resenha maravilhosa, aumentando mais ainda a vontade que eu tenho de completar as leituras. Obrigada por compartilhar!

    Bjoxx ~ www.stalker-literaria.com ♥

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  6. Oi Gabi.

    Parabéns pela sua incrível resenha. Eu quero muito ler Sylvia Plath, mas eu confesso ter um certo medo da sua escrita, sabe? Mas eu acho os temas abrodados, a forma melancólica e intensa que ela escrevia (pelo o que eu vejo de resenhas e quotes) muito atrante. Eu AMEI a sua resenha, deu uma grande dimensão sobre o que é esse livro e eu acho que vou gostar muito de ler.

    beijos! <3

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  7. Olá,

    Confesso que tenho um certo medo em ler as obras da autora, não porque não irei gostar, mas por ela ser conhecida por suas publicações tristes. Até gosto de publicações desse tipo, no entanto, às vezes é difícil fazer esse tipo de leitura, tem que estar com o humor muito bom. Enfim, achei fascinante tudo o que descobri através de seu texto, é horrível saber que por pouco a Sylvia não teve seu desejo de ser ouvida atendido.

    Beijos,
    oculoselivrosblog.blogspot.com.br/

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  8. Olá!
    Nossa deve ser uma leitura bem impactante principalmente para nós mulheres. Não conhecia essa autora e o tom de seus textos apesar de melancólicos, com um teor de sofrimento tão intenso, me deixou com vontade de saber mais sobre o restante dos poemas.
    Sua resenha está tão explicadinha e fico contente que você tenha conseguido seu exemplar.
    Beijos!

    Camila de Moraes

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  9. Oi querida!
    Eu não conhecia esse livro, e até passaria longe dele se tivesse vendo ele apenas pela capa ou se soubesse que é um livro de poemas. Mas com a sua resenha e vendo que ele é bilíngue, não tem como não se interessar por essa obra. Além do mais, será o meu primeiro contato com a autora... e vamos ser sinceros, que autora maravilhosa!
    Não tinha lido nada sobre ela, e saber tanto sobre ela em apenas uma resenha, me fez querer saber mais sobre ela. Adorei as fotos e amei a sua resenha, já coloquei esse livro na lista de desejados da amazon, e espero gostar tanto quanto vc gostou.

    Beijoss, Enjoy Books

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  10. Oi, tudo bem?
    Eu confesso que não costumo ler poemas e que não conhecia esse livro ainda, mas ao ler sua resenha fui ficando cada vez mais curiosa. Bom, parece ser uma leitura muito interessante e bonita, os temas dos poemas são complicados e isso deve causar muita reflexão no leitor. Enfim, eu não conhecia nada sobre a Sylvia e por essa razão gostei muuito mesmo do seu post de hoje, porque fui apresentada à uma figura muito interessante e vou buscar conhecer mais sobre ela e seus trabalhos.

    Beijos :*

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  11. Oii tudo bem??

    Que livro lindo, e fiquei bastante interessada, mesmo sendo poemas.
    Interessante essa questão de tradução. É realmente complicado o que me pergunto se leria ou não.
    Mas acredito que sim, pois acho que minha curiosidade é maior, fiquei realmente cativada pela resenha.
    Adorei
    Bjus Rafa

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  12. Oi Gabi,
    Ainda não conhecia esse título, mas não me surpreendi por isso, pois não gosto de poesias. Fiquei contente por saber que você, finalmente, teve a oportunidade de ler, mas triste por ver que alguns poemas foram deixado de lado, mas achei legal a filha de Sylvia ter tentado reuni-los novamente.
    Vou indicar esse livro para uma amiga, pois achei a cara dela.
    Beijos

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  13. é desesperador quando queremos muito um livro e não o encontramos pra comprar!!! Ainda bem que a Verus relançou e voce pode ter o seu exemplar nas mãos. Senti pela sua resenha que a leitura foi bem tocante e já quero ler também. Nunca li nada da autora, mas sempre ouço elogios.
    beijos

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